Você já parou para observar quais são as maiores empresas do mundo? Hoje as top 5 são digitais e juntas têm um valor de mercado jamais visto. Em um mundo cada vez mais digital e conectado, exercem uma influência e poder cada vez maiores.
Imagine então o impacto que elas têm sobre nós! Essas megacorporações digitais detêm dados de bilhões de pessoas e a partir deles, com o auxílio de seus algoritmos computacionais, conhecem nossos hábitos, podem supor e tirar conclusões acerca de nossas personalidades, o que já tem sido sistematicamente utilizado para orientar o que nos é exposto, direcionando nossas preferências, influenciando o processo democrático pela ação de hackers – como observado na última eleição presidencial estadunidense. A disseminação de notícias falsas, as chamadas fake news tornou-se uma verdadeira praga nas plataformas e redes sociais.
A promessa inicial da internet – talvez o mais precioso bem público criado – de que seria um grande espaço público e democrático tem sido colocado em cheque. Tal situação tem chamado a atenção da sociedade civil e dos governos e tem sido foco de importantes debates pelo mundo.
Tamanho Descomunal
As GAFAM (acrônimo criado para se referir às gigantes digitais Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft) figuram no topo das maiores empresas do planeta e o que elas têm em comum é o fato de serem todas organizações digitais. Segundo o economista e professor da Universidade de Columbia, Jeffrey Sachs, juntas elas somam um valor de mercado aproximado de US$ 3,2 trilhões (para se ter uma ideia de grandeza, o PIB brasileiro de 2017 fechou em US$ 2,2 Trilhões).

Individualmente o Facebook, controla um ecossistema assombroso com mais de 1,6 bilhão de usuários na rede social original, 1 bilhão no WhatsApp, 900 milhões via Messenger, 400 milhões no Instagram.
O Google, por sua vez domina 5 das 6 principais plataformas digitais: Google (buscas), Youtube (videos), Android (sistema operacional de smartphones), Google Maps (mapas) e Google Chrome (navegadores).
Juntos Facebook e Google dominam os anúncios na internet, respondendo por 84% do mercado fora da China em 2016, conforme publicado pela consultoria WMedia, da agência WPP.
O Facebook é o maior portal de notícias do mundo mas sem produzir nenhum conteúdo, ao passo que o Google é a empresa de comunicação mais poderosa do mundo através do Youtube.
A Amazon, líder global absoluta no comércio digital, controla 44% da capacidade de computação em nuvem de todo o mundo, tendo como clientes Netflix e a Agência Central de Inteligência dos EUA (CIA).
Recentemente a Apple repatriou uma quantia absurda de US$ 252 bilhões disponível para investimento imediato.
A Microsoft impõe há décadas uma liderança, quase onipresença, em sistemas operacionais de computadores através do Windows e do pacote Office.
Poder, Influência e Obstáculo para Inovação?
A coleta e o uso sem vigilância de dados de bilhões de usuários tem dado às gigantes digitais um poder jamais visto. O recente escândalo envolvendo o fornecimento de dados de mais de 50 milhões de usuários pelo Facebook para a empresa Cambridge Analytica, que trabalhou na campanha presidencial do hoje presidente estadunidense Donald Trump, evidenciou o poder que a gigante digital detém em suas mãos.
O professor titular do Departamento de Economia da FEA/USP, Ricardo Abramovay, em entrevista à Rádio CBN (Programa Revista CBN em 18/03/2018, Modelo de negócio dos gigantes digitais tem representado ameaça à democracia), alertou para o que chamou de criação de uma “esfera pública fantasma” em que a propaganda política é massiva, pois é dirigida para uma quantidade enorme de pessoas. Mas não é pública por ser individualizada, uma vez que se apoia no perfil que as mídias digitais têm dos usuários, baseados em suas preferências. A questão é que elas acabam direcionando informações que correspondem ao que eles acreditam, fornecendo inclusive informações mentirosas por meio de seus algoritmos “inteligentes”, mas que atendem aos anseios de quem as recebe.
Há também a tese de que as gigantes digitais ironicamente se colocam na contramão do processo de inovação, pois uma vez que elas possuem conhecimento antecipado de tudo o que ocorre no globo, aliado a sua capacidade de processamento de dados através de seus algoritmos, podem sufocar movimentos concorrenciais ou tendências naturais do mercado que poderiam representar inovações.
Tal postura tem sido interpretada como destrutiva à livre concorrência de mercado e vai de encontro a ideia principal da internet de que ela facilitou o desenvolvimento de negócios exponenciais, devido a derrubada de barreiras de entrada e ironicamente essas corporações são fruto justamente disso.
Tanto é que o jornal britânico Financial Times se refere de maneira irônica às gigantes digitais como GOSPLAN 2.0 (GOSPLAN era o todo poderoso órgão de planejamento centralizado da União Soviética, daí a ironia), devido ao poder descomunal que elas detêm de antecipação do que acontecerá no mercado.
A Amazon opera hoje um monopsônio, cuja diferença para o monopólio (em que um único operador atua no mercado e aumenta os preços ao seu bel prazer), é que existe um único comprador dominante e ele baixa os preços de seus fornecedores. Então a empresa que nasceu com o discurso de eliminar os atravessadores, hoje debaixo de nossos narizes, vem esmagando todos os concorrentes, forçando-os a abandonar a ideia de alcançar diretamente os consumidores, ou seja fazendo que eles se tornam dependentes unicamente dela.
Nos últimos anos elas sistematicamente adquiriram empresas concorrentes ou potenciais rivais: Google comprou o Youtube (2006) e Waze (2013); Apple adquiriu Siri (2010); Facebook arrematou o Instagram (2012) e Whatsapp (2014), além de praticamente aniquilar o Snapchat.
O outro termo recentemente cunhado substituto ao GAFAM e observado pelo jornal The Economist é o acrônimo BAADD (big, anti-competitive, additictive and destructive to democracy), ou seja, grandes, anticoncorrenciais, geradoras de dependência psicológica e destruidoras da democracia.
Sociedade e Governos Debatem e Agem
Os debates envolvendo as gigantes digitais têm se concentrado em relação ao uso indiscriminado dos dados dos usuários, a influência delas no processo democrático e suas práticas de mercado.
O ex-presidente dos EUA, Barack Obama, recentemente em conferência realizada em fevereiro no MIT afirmou que “Google e Facebook precisam passar por uma discussão pública sobre seus modelos de negócios, que reconheça que eles não são só um negócio, mas também um bem público.”

Há um crescente debate que discute que o modelo de negócio dos gigantes digitais tem representado ameaça à democracia, em que há a tendência de que a internet vire (se é que já não virou) uma bolha de redundância em que todos nós ficamos expostos a informações que só reforçam nossas crenças e direcionam a opinião pública, como no caso das últimas eleições presidenciais nos EUA e do Brexit.
O criador da World Wide Web, ou internet, Tim Berners-Lee, expressou toda sua preocupação em carta aberta publicada este mês: “O fato de que o poder está concentrado entre tão poucas empresas tornou possível transformar a web em uma arma de grande escala”.
Tim Berners-Lee alerta para a propagação de notícias falsas (fake news) sem nenhum controle ou curadoria por parte das detentoras das plataformas digitais: “Nos últimos anos, vimos teorias de conspiração virar tendência em plataformas de redes sociais, contas falsas no Twitter e no Facebook acumularem tensões sociais, atores externos interferirem em eleições e criminosos roubarem dados pessoais”.
Jeffrey Sachs, em entrevista à Folha de São Paulo afirmou que: “As cinco grandes, Apple, Amazon, Aphabet (Google), Facebook e Microsoft têm hoje um valor de mercado de US$ 3,2 trilhões. É simplesmente inimaginável a concentração de valor e o quanto seus donos ficaram ricos. E elas têm uma vantagem que só agora está sendo compreendida: monitoram tudo o que fazemos, vendem nossas identidades. Estão vendendo nossos hábitos de consumo, as suposições que fazem sobre nossas personalidades e preferências políticas. Não apenas monopolizam, distorcem a distribuição, ao enviar informações diferentes para diferentes pessoas, e sendo pagas para isso”.

A União Européia tem se posicionado de forma dura no que se refere a uma política de regulamentação destas empresas principalmente do ponto de vista do uso dos dados dos cidadãos como em relação aos aspectos tributários.
Na Alemanha há previsão de multa de €50 milhões para plataformas de internet que não removerem o discurso de ódio dentro de 24 horas.
Hoje as gigantes digitais pagam em média 9,5% em impostos ante 23% pagos pelas firmas convencionais. A intenção da União Européia é que corporações que tenham um faturamento global acima de 750 milhões de euros ou de 50 milhões de euros em território da UE paguem uma alíquota de imposto digital de 3%, com o intuito de proteger pequenas empresas e startups.
Recentemente a Unilever, uma das maiores anunciantes do mundo, ameaçou retirar seus anúncios do Facebook e Google, por questionar a transparência dos métodos usados pelas empresas.
Conclusões
A humanidade viu algo similar ao que presenciamos hoje no caso da Standard & Oil no início do século XX, porém o que vivemos hoje é algo muito mais complexo, pois há ainda muitos questionamentos em relação a como desenvolver um sistema de regulação para empresas que operam na esfera do intangível, operando em um ambiente virtual com impacto tão direto e amplo no mundo real.
O fato é que qualquer ente, seja estatal ou privado, deve prestar contas de suas ações para com a sociedade civil e esta precisa ser vigilante e atuante para preservar as estruturas que sustentam a democracia.
Há quem afirme que o Google e o Facebook entregam seus serviços de graça em troca da coleta de nossos dados e que somos seus clientes, afinal colaboramos com o desenvolvimento das plataformas, mas pensando bem tem uma frase que diz: “se você não está pagando, você não é o cliente; é o produto”.
Se você ainda ficou com dúvidas ou está cético em relação ao que foi exposto, saiba e reflita que esse artigo, o qual só chegou a seu conhecimento por meio da Internet, teve boa parte de suas referências pesquisadas no Google, foi produzido na plataforma Google Docs em dispositivos que rodam sistemas operacionais Microsoft e Apple, será publicado em nossa página hospedada em um servidor na nuvem, será divulgado usando nosso perfil no Instagram e Facebook e foi elaborado com referências de livros que foram comprados pela Amazon.