*Por Heloisa Godoy
As mães também são responsáveis por alimentar a economia do País – um bebezão sempre faminto, exigente e mimado. O forte apelo emocional é o que faz com que o Dia das Mães ocupe a posição de segunda data mais importante para o comércio brasileiro, perdendo apenas para o Natal. Em 2017, movimentou cerca de R$ 1,9 bilhão só em vendas pela internet, um crescimento de 16% em relação a 2016. Para este ano, a estimativa para o comércio geral é de avançar entre 4,5% e 5%, de acordo com a Boa Vista SCPC.
O economista Flávio Calife confirmou recentemente o que nos parece lógico: que o restabelecimento das condições financeiras dos consumidores é o que motiva a aceleração nas vendas na data. “Esta expectativa se deve a uma melhora do cenário econômico, que reflete não só no aumento de postos de trabalho, mas também no mercado de crédito”.
Mas será que esse aquecimento do País e do mercado de trabalho também foi repercutido na empregabilidade das mulheres, em especial das mães de crianças ainda pequenas?
Mais mimos e menos empregos
Se a previsão para o próximo domingo é de presentes mais quentinhos e ensolarados, para os bolsos, recheados com dinheiro conquistado pelo próprio trabalho ainda é de nuvens densas, chuvas e trovoadas. Ao mesmo tempo em que as notícias tratam do aumento do consumo no Dia das Mães, pesquisas relacionadas à geração de renda e à empregabilidade das mulheres alertam sobre as dificuldades e as más condições de trabalho que nascem juntinho dos bebês.
Um recente estudo conduzido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelou que enquanto 75% dos homens com mais de 15 anos está no mercado formal, entre as mulheres essa proporção é de apenas 48,5%. A renda delas equivale a 76% do que recebem seus colegas do sexo oposto (conforme IBGE). A diferença salarial chega a quase 53%, tendo caído apenas 0,6% entre os anos de 2005 e 2015, segundo a OIT. E as mulheres continuam sendo minoria entre os principais assentos de chefia ou gestão (como posições de diretoria, por exemplo).
Além de não receberem nas corporações as mesmas oportunidades de desenvolvimento, diversos aspectos se tornam obstáculos na carreira quando a profissional decide ter um filho. Podem variar desde uma eventual pressão psicológica velada durante a gravidez, quando a mulher passa a ser considerada “custo” pelo período em que ficará afastada, até sua demissão ao retornar da licença-maternidade – sim, 48% das mães acabam desempregadas no primeiro ano após o parto.
Há, ainda, a impossibilidade de conciliar o inflexível modelo tradicional de trabalho aos cuidados com o pequeno cidadão. E o triste preconceito contra as que estão em busca de recolocação, tão comum nas entrevistas de emprego, no momento em que mencionam a idade do filho (se você chegou até aqui, PRE-CI-SA conhecer o experimento social narrado pela Camila Conti, cofundadora da Rede Maternativa).
E o cansaço, minha gente? Segundo o Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça do IPEA, as Xenas guerreiras trabalham, em média, 7,5 horas por semana a mais do que os homens devido à dupla jornada, que inclui tarefas domésticas e trabalho remunerado (eu diria tripla, se considerarmos que os cuidados com o filho é um ofício que demanda capacitação adicional). A licença-maternidade em vigor no Brasil varia de quatro a seis meses, período em que mãe, geralmente, ainda não está apta a retomar o mesmo ritmo de antes. Ela quase não dorme, por ser a principal responsável pela alimentação do bebê (com a amamentação) e, consequentemente, por estar vivendo um período de exaustão física e emocional.
Empreendedorismo materno é tiro, porrada e leite
Mas o que fazer quando se tem mais uma boquinha para alimentar e menos oportunidades no mercado corporativo? Diante desse cenário, muitas mães chegam à conclusão de que se dedicar a um negócio próprio, no modelo de home office, é a oportunidade de ouro para trabalhar enquanto cuidam da cria.
Assim, 75% das mulheres decidem empreender com a chegada dos filhos – e, na classe C, essa porcentagem aumenta para 83%, conforme pesquisa da Rede Mulher Empreendedora (RME). O movimento é o chamado empreendedorismo materno. O mais comum nesse segmento é aderir a uma atividade que não exija presença física permanente em horário integral. Essa premissa se confirma com as razões para empreender apontadas na pesquisa da RME: 52% estavam em busca de flexibilidade de horário, com 68% afirmando trabalhar em casa na maior parte do tempo.
No entanto, empreender por necessidade, sem planejamento, geralmente é fator de grande insucesso. Ter um negócio próprio não é para qualquer um. É tiro, porrada e bomba. E começar um empreendimento do zero, enquanto cuida de uma criança, pode ser uma furada. Um quarto das startups brasileiras morrem antes de completar um ano e 50% delas não passam dos quatro anos (conforme atestou a Fundação Dom Cabral).
Comprometimento é um dos segredos para a longevidade do negócio. É um outro filho! É preciso vender, se organizar para fazê-lo crescer forte e saudável. Para isso, muitas vezes, é preciso colocar o trabalho à frente de tudo. Um modelo de monetização equivocado é outra grande causa de falência. É necessário, ainda, conhecer profundamente o seu cliente, pesquisar, saber exatamente que dor quer (ou sabe) resolver – e, a partir daí, transformar sua iniciativa em referência nesta solução.
Outro fator de frustração é que, ao empreender, muitas mães decidem se aventurar em nichos de negócios dos quais são apenas consumidoras e que têm pouca ou nenhuma experiência profissional, em vez de darem sequência à carreira que vinham construindo antes da maternidade. E-commerce, negócios voltados ao artesanato, à culinária ou ao vestuário infantil costumam ser os favoritos das mães empreendedoras.
O melhor presente é o seu apoio
Encontrar um novo compasso para “faturar o leitinho das crianças” – seja no mundo corporativo ou em voo solo – requer que o suporte à mãe venha, principalmente, da família – e, quem sabe, até dos amigos mais próximos. É preciso desenvolver uma rede de apoio, que deve começar em casa.
Essa mulher precisa poder falar abertamente sobre as suas dificuldades, deixando claro que É ABSOLUTAMENTE IMPOSSÍVEL DAR CONTA DE TUDO SOZINHA (até dá, mas não é saudável pra ninguém). E deve realmente abrir espaço para dividir as responsabilidades domésticas e os cuidados da criança com o pai e/ou com outras pessoas que, com ela, compartilhem a vivência diária. Por isso, a decisão de empreender precisa ser coletiva, já que as mudanças serão sentidas por todos.
À essa altura você deve estar se perguntando, “mas e o tal presente inovador?”. Tenha certeza de que o melhor que pode fazer por uma “mãe trabalhadora”, especialmente as que têm filhos ainda pequenos, é ajudar. Ou, pelo menos, tentar. Se você é parte do time de uma grande empresa, ative a sua rede de contatos e indique uma profissional que esteja em busca de recolocação. Se é fera em finanças, vendas, ou marketing, dê dicas valiosas àquela empreendedora que está precisando de um gás em seu negócio. Se está desempregado, doe seu tempo, seu abraço, seus ouvidos.
Solidariedade, empatia e sororidade não são apenas termos da moda, que enfeitam posts e promovem engajamento nas redes sociais. Eles fazem milagres se, com dedicação, realmente forem postos em prática. #colaboração #muitoamor #gratidão